TAO e Tocando em frente
- evandro melo
- 26 de mai.
- 3 min de leitura

Fui agraciado com um par de ingressos para assistir Almir Sater. Gosto bastante da sua música, seu virtuosismo em sua viola, os arranjos, e tudo combinado com letras profundamente descomplicadas. Almir cria, toca e canta com a alma, e diante disso, só resta ouvir, também com a alma.
Dentre sucessos e canções, por mim, pouco conhecidas, ele passa por mitologia brasileira, nascida e preservada na cultura popular dos interiores do Brasil. Curupira, lobisomem, bruxas, Saci e por aí vai. Lembro das histórias de meus avós, criados na roça, sobre homem que virava árvore, travessuras do Saci, simpatias para curar soluço ou para criança falar, reza para quebranto. Saudade dos véinhos.
Já há alguns anos, decidi por seguir a linha da Psicologia Analítica, desenvolvida por C.G. Jung, e tenho me debruçado nos estudos desde então. Livro atrás de livro, conversas, cursos. E a cada achado novo, vem junto um punhado de outros achados. É sem fim. Um desses achados tem sido a cultura milenar chinesa, muito estudada por Jung e tão presente em sua teoria. Disso veio meu interesse por conhecer o TAO. A filosofia, antes da religião. Sigo sem interesse em religião qualquer. Mas nas filosofias por detrás delas, sim.
O TAO, bem resumidinho, significa “o Caminho”, a força natural do universo, e tem por fundamento a filosofia de viver em harmonia com a ordem natural das coisas. Princípio básico do TAO é o Wu-Wei, ou, a ‘Ação pela não-ação’. É o aceitar o fluxo, ao invés resistir a ele e com isso causar sofrimento. Para o TAO, é nessa resistência ao fluxo perfeito, que se origina todo sofrimento.
Bom, mas o que tudo isso tem a ver? É que durante o show, fui observando uma coisinha ali e outra aqui, nas letras de Almir Sater, que me remeteram a filosofia do TAO. E mais ainda quando ele cantou seu maior sucesso, ‘Tocando em frente’.
A letra fala sobre o sujeito que aprendeu a viver mais devagar, a sorrir, e ser mais forte, porque já correu, já chorou e já quis saber demais. Mas vai além, e para mim numa belíssima narração poética do que é o TAO, quando diz: "Conhecer as manhas e as manhãs, o sabor das massas e das maçãs”. E continua “É preciso amor pra poder pulsar, é preciso paz para poder sorrir, é preciso a chuva para florir”. Ora se não é alguém se dando conta do caminho perfeito, do fluxo imperativo, e de que nada vale lutar contra esse fluxo. E o arremate é preciso “Penso que cumprir a vida, seja simplesmente, compreender a marcha e ir tocando em frente.” Que coisa linda meus amigos.
Não há separação entre nós e o caminho, por isso a importância de encontrar harmonia. E para me dar razão, Almir Sater canta “Eu vou tocando os dias pela longa estrada, eu vou. Estrada eu sou”.
Aqui um ponto importante, aceitar o fluxo e viver em harmonia, ou praticar o Wu-Wei, não tem a ver com terceirizar todas as decisões e viver a filosofia de outra música, essa do Zé Pagodinho, “Deixa a vida me levar, vida leva eu”. Tem a ver com compreender a marcha, compreender a jornada, nos compreendermos. A não-ação aplica-se às neuroses de controle, de querer ensinar ao rio seu curso e limites. É essencial conhecer a si mesmo, somente assim conheceremos o caminho, compreenderemos a marcha e poderemos tocar em frente.
***




Comentários